Paixão e Amor no Casamento
Muitas pessoas tendem a diferenciar a paixão e o amor com a ideia de que a paixão é apenas algo passageiro (e algumas vezes até ilusório) e o amor é verdadeiro e duradouro. Além dessa diferenciação, digamos mais “superficial”, muitas pessoas também se pergunta muitas coisas, como por exemplo se é possível vir a amar a alguém por quem se esteja apenas apaixonado, se é verdade que a paixão sempre acaba no casamento e se até se os dois realmente são “incompatíveis”.
A verdade é que o que atrai uma pessoa a outra, pelo menos nos primeiros contatos, é apenas o conjunto de sentimentos que esta pessoa causa na outra, com base na impressão que ela causa, ou seja, com base na ideia que uma faz da outra; o que pode ser, portanto, uma completa ilusão. E mesmo que a realidade da outra pessoa não seja assim tão distante do que se imagina, ainda assim essa imagem estará sempre muito carregada de subjetividade, ou seja, as impressões que se tem do outro tem sempre base na “história de vida” de cada um, nem sempre sendo, portanto, a verdade. Um exemplo bem simples e reduzido pode ser o de um menino, que com base nas suas relações com os seus pais, irmãs, irmãos, amigas, amigos, etc. torna-se um adulto com a opinião (de forma consciente ou não) de que “mulheres mais reservadas costumam ser mais românticas”, e o romantismo é algo que ele busca em uma mulher. Assim, na escolha de suas parceiras, ele logicamente tenderá a observar, entre diversos outros detalhes, ( e também de forma consciente ou não) esses traços nas mulheres e poderá se encantar com uma mulher que pareça mais reservada, por logo associar essa característica a ela. Assim acontece com todas as características que as pessoas associam como sendo “positivas” ou “negativas” e que são sempre construídas ao longo da vida, com base nas suas relações com parentes, amigos, amores e a cultura em geral. Um homem, pela sua história, pode, por exemplo, associar beleza à futilidade e portanto não se sentir atraído por pessoas que considera muito “belas” por pensarem que elas podem ser fúteis. Mas outra pessoa, se passar por experiências que confirmem o contrário, podem pensar o inverso e então valorizar ainda mais as pessoas que cuidam da própria aparência. O mesmo pode ocorrer por exemplo com uma mulher que passou a acreditar, pela sua história de vida, que homens que adoram futebol costumam ser grosseiros e machistas. Esse traço específico pode fazer com que ela nunca se interesse por homens desse tipo. E assim vamos formando todas as nossas opiniões a respeito do que é valorizado e rejeitado no outro.
E o que isso tem a ver com a paixão, com o amor e, principalmente com a felicidade no casamento?
A paixão é a fase da idealização. É quando o outro parece satisfazer todos os nossos desejos mais íntimos, pois se encaixa o perfil de pessoa que acreditamos que pode nos trazer a felicidade tão esperada. Nessa fase costumamos enxergar apenas as melhores características da pessoa amada; todas aquelas que aprendemos, na nossa história de vida, a considerar importantes e portanto, a valorizar e a buscar no outro.
Todos tem, em sua imaginação, a imagem do marido ou da esposa perfeita e, embora todos saibamos que a perfeição não existe, tendemos sempre a projetar essa perfeição no ser amado. Então, quando encontramos alguém que pareça se encaixar nesse ideal, pronto, todos aqueles anseios de felicidade tão sonhada vêm à tona e a impressão é a de que o outro pode tornar todos esses desejos possíveis. É a fase do encantamento, onde tudo parece maravilhoso, perfeito e indestrutível. A doce sensação do “que seja eterno enquanto dure”.
Portanto, a paixão ocorre a partir de uma idealização do outro e essa idealização pode acontecer em diversos níveis de consciência; quanto mais inconsciente, mais “distante da realidade”. E quanto menos inconsciente, mais próxima da verdade do outro.
Quando a distância entre o ideal e o real é muito grande, o marido ou a esposa, que se casaram tão apaixonados, entram na fase da desilusão amorosa, que muitas vezes ocorre já no primeiro ano do casamento, quando passam dividir o mesmo teto. A esposa já não é mais tão carinhosa, o marido já não é mais tão divertido ou, pior, em alguns casos maridos e esposas tem a impressão de terem se casado com um completo estranho, pois sentem como se o outro tivesse “mudado completamente” do que era no início da relação. Claro que quando se conhece alguém e quando não se mora junto é mais fácil mostrar o nosso lado mais “encantador” porém, quando a distância entre o marido/esposa do início da relação e do marido/esposa atual é realmente muito grande, aí podemos então tirar a conclusão de que sim, a idealização foi realmente muito alta e portanto, muito inconsciente (quando mais inconsciente esta idealização, mais tendemos a “florear” a personalidade do outro e consequentemente, maior é a queda da desilusão).
Assim, podemos dizer que sim, é possível que a paixão se torne amor e sim, também é possível que a paixão acabe depois do casamento. O que vai definir esses acontecimentos é, antes, a proporção entre a carga de subjetividade x a carga de objetividade que foi colocada sobre o parceiro:
O nível de subjetividade indica o quanto a suas crenças que foram baseadas na sua história de vida pesam no que você pensa e sente em relação ao outro.
O nível de objetividade indica o quanto o que você pensa e sente pelo outro se adequa ao que ele realmente é.
Quanto menos inconsciente e portanto mais próxima a idealização da realidade, menor será a desilusão e portanto, maior a probabilidade de encontrar a felicidade no casamento.
Quanto mais inconsciente for a idealização e portanto, mais distante o ideal do real, maior será a probabilidade de que a paixão realmente acabe depois do casamento, pois maiores serão as decepções e desilusões com o parceiro. Mas ainda há esperança, pois aqui nos referimos a uma maior probabilidade pois, mesmo que se perceba, após o casamento, que o outro não era tudo aquilo que se imaginava, caso seja possível encontrar outras características na personalidade do parceiro que compensem essa decepção, a paixão pode sim, acabar, mas pode ser também transformada em amor.